Que desgosto, pereira!

Pois bem. Uma das pereiras do meu avô, plantada sempre com carinho e tratada com toda a dedicação, nunca deu um único fruto. Nada. Zero. Apesar da poda, dos enxertos e dos fertilizantes naturais – os porcos sempre se encarregavam de "gerar" o adubo –, a pereira teimava em mostrar na altura certa da época os seus galhos vazios, para desalento do meu avô.
Um belo dia, por volta dos meus oito anos, talvez menos, estranhando a minha avó o meu silêncio prolongado, foi dar comigo no quintal, à beira dessa mesma pereira, a pregar pregos no tronco da árvore. O verde que as peras deveriam ter passou-se para a cara da minha avó. "Ai meu Deus, que o teu avô se vê isso mata-te".
E lá esteve ela, com toda a paciência do mundo, a tirar à mão os pregos, uma a um, do tronco da pereira. A minha força (ou o meu entretenimento!) só me fez martelar suavemente, deixando os pregos quase na totalidade à vista. Mas as marcas ficaram.
A verdade é que na temporada seguinte, o meu avô teve que escorar os galhos, pois estes não aguentavam o peso das inúmeras peras que rebentaram nesse ano. A minha dizia que tinha sido uma por cada prego que tinha espetado, mas isso já era história a mais. O resto é verdade que eu bem vi. Nem eu próprio queria acreditar. E que peras boas, rocha, que a árvore deu.
O meu desgosto é que essa árvore morreu. Secou. Definitivamente. Confesso que olhei a árvore com tristeza e foi precisamente nesse momento que percebi o significado de se morrer de pé. Galhos secos e quebradiços, tronco gretado, casca completamente cinzenta. Mas mesmo assim não tive coragem de cortar pela raiz. Deixei pouco menos de meio metro acima da terra e vi que a cor castanha da madeira não enganava: nem um simples veio verde ou uma gota de seiva saía dali. Que desgosto, pereira!
Há outras, mas podiam ter morrido todas, menos aquela. Esta da imagem. Cortei-a na esperança deste calor e das próximas chuvas fazerem-na renascer. Se os pregos foram o milagre da peras, porque não pode haver outro?
A última coisa a cair é a esperança e enquanto ela existir podemos sempre esperar um milagre. Pode ser que as mãos do nosso menino que tanto se aplicou no corte da pereira repitam o milagre.
Fica bem
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Unknown |
2:58 da tarde
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